quarta-feira, 25 de maio de 2011

A Influência da Mídia nos Padrões de Beleza



                                           A  influencia da Mídia nos padrões de Beleza
 
O papel dos meios de comunicação vem através dos tempos e da mídia moderna, construindo novos valores na sociedade capitalista, no mercado consumidor e no padrão de beleza.

Com a  influencia da mídia, não só as mulheres como homens também estão na busca frenética pela beleza perfeita, e tudo isso se deu com o cinema de Hollywood que ajudou a criar novos padrões de aparência.
Os programas  de Tv vem cada vez mais dedicando espaço para apresentar novos produtos. O consumo gerado  pela mídia foca cada vez mais jovens e mulheres a comprarem produtos e assim obter na sociedade a beleza perfeita imposta pelo mercado.
 
A mídia mostra cotidianamente que a beleza perfeita se refere,  a um corpo saudável ,a boa alimentação,aos exercícios físicos entre outros,evidentemente que tudo isso tem um preço e que nem todos podem pagar.O certo seria uma mudança na forma de comunicação possibilitando meios de comunicação alternativa(rádios e TVs)que poderá influenciar positivamente os padrões impostos.


segunda-feira, 23 de maio de 2011

Somos todas clandestinas!

Em todos os lugares, de várias idades, com seus sorrisos e choros, olhares de medo, muito mais do que se imagina, mulheres, muitas, optam por interromper uma gravidez indesejada, todos os dias.
Tudo bem, esse assunto não é novo, sabemos que podemos formar uma rede atemporal e que essa decisão estará presente, nem precisamos nos preocupar com o tempo verbal. A configuração desse tema em determinado contexto, sim, sempre é uma questão, polêmica, diga-se de passagem.  Mas podemos dizer seguramente que trata-se de um elo resistente das mulheres, sua clandestinidade (assumida).  
Não nos importam os motivos, as razões dessa opção. Na realidade, eles não importam para ninguém.  Da minha parte, digo que não importa, pois as mulheres fazem suas opções com bastante ponderação e reflexão. O corpo é das mulheres e cabe a elas a decisão sobre uma – possível – gestação. Trata-se de uma decisão individual.   
Eu sei que é um argumento pouco palatável.  Primeiro, “razão” e “escolha” são palavras historicamente retiradas da lingüística das mulheres. Embora, obviamente, façam parte da vida das mulheres. Em outro lado, mas complementando-se, espera-se da “verdadeira mulher” a dedicação e negação de sua individualidade.   
Afinal, parece que tudo relacionado ao cuidado e a reprodução são tarefas inerentemente femininas. Sempre foi assim...  Desde crianças elas recebem “presentes” , “conselhos”, “educação”, “desenhos”  que minuciosamente configuram um formato sobre “feminilidade”. Em muitos momentos, inclusive, tentou-se – e tenta-se -  relacionar essas características aos hormônios ou a uma “natureza”. Inclusive, sempre me perguntei “que natureza é essa? Tão distante de mim mesma? Tão insensível aos meus desejos?”.   Mas sabemos que essa naturalização é conto para fazer as mulheres dormirem.  De fato, no entanto, o que as mulheres dizem, o que suas vozes “clandestinas” altas e rítmicas bradam é outra tema. Sua clandestinidade guarda o sentido e o desejo de sua autonomia.
A opção pelo aborto é marcada por conflitos, por dúvidas, por medos. É perigosa. Ela é a resenha das recusas impostas, das negações, do excesso de responsabilidades e das imposições cotidianas.  A corrida pelos métodos anticoncepcionais, nunca 100% eficazes, mas sempre responsabilidade feminina. O destino à maternidade para a configuração do feminino. Meiguice, gentileza, cuidado, atenção, respeito, docialidade, silêncio, compreensão, escuta, amor, carinho. Tantas outras palavras formatadoras de um ser que vive para o outro.  Nesse sentido, não poderia deixar de destacar, a abstenção, que seguramente é uma das características mais exaltadas na “verdadeira mulher”.
O aborto incomoda tanto e é exatamente a negação da abstenção. Ele é negado, vetado, impedido, proibido às mulheres, mas é silenciosamente praticado. A clandestinidade assegura o direito ao silêncio, assegura a recusa às satisfações e justificações. Inclusive, medidas exigidas cotidianamente às mulheres, por outros tantos – todos – motivos.    
As mulheres dizem “não” cotidianamente a esse destino fantasmagórico que lhe é imposto, dizem “não” a negação de sua individualidade. Dizem sim ao seu desejo e a construção de suas vidas. Diante do medo, do receio, de todas as negações, elas optam por viver.
O aborto continua criminalizado no Brasil, mas isso não impede sua realização. Não impede que as milhares de clandestinas resistam e lancem suas vozes de liberdade. Mas causam muito medo, dor e sofrimento. Exatamente por isso permanece atual a centralidade da defesa da legalização do aborto, um direito à vida das mulheres, um direito à autonomia, um direito à escolha! 

*Por Ana Cristina Pimentel, militante da MMM de Juiz de Fora/MG e secretária da Juventude do PT de Minas Gerais.

sábado, 21 de maio de 2011

O que ela quer da gente é coragem!

O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa sossega e depois desinquieta.  O que ela quer da gente...
Assim amanheceu o dia 19/05 como mais um dia típico no correr dos grandes centros urbanos. Ao menos é o que parecia, mas rapidamente os jornais noticiavam ocupações em vários prédios abandonados e em diversas regiões do país. Cerca de 25 manifestações foram realizadas em 12 Estados, para reivindicar o Direito a Moradia Digna e a Cidade!
 Desde 1988 quando da luta pela Constituinte os Movimentos Urbanos de Moradia vem colocando na pauta do dia, do governo e como garantia constitucional a luta por uma política decente de Habitação e de Reforma Urbana, conquistando a garantia da moradia como um Direito Humano e lutando para garantir a função social da terra.
Mas a luta não se encerra nisso, ao contrário abarca questões que envolvem e a  luta pela saúde, pela educação, pelo reconhecimento dos direitos e das diferenças.  Ter um local para morar encerra não só o teto, moradores de rua “moram”, mas em que condições?! Moradia Digna significa reconhecer os seres humanos como cidadãos portadores de direito.
Interessante observar e que explica a importância dessa luta, é o fato de que em sua grande maioria as/os ocupantes são mulheres  e negros/as, que não por acaso são as parcelas da sociedade mais esquecidas pelas políticas públicas e que mais sofrem os efeitos históricos da discriminação. Se existe moradia digna e tudo o que isso encerra,se há uma política decente de habitação que priorize os setores mais pobres do Brasil , melhora a vida desses setores sociais, e os coloca como sujeitos da vida política e portanto da cidadania.
O Programa Minha Casa, Minha Vida é sem dúvida um avanço em termos de Política Habitacional, mas não tem cumprindo as metas necessárias para atender as parcelas mais necessitadas da população. Grande parte dos projetos de habitação tem sido direcionados a contingentes que ganham de 06 salários mínimos para cima, além de que o programa gerou distorções que levaram a uma verdadeira especulação imobiliária.
No Dia Nacional de Luta pela Moradia Digna os Movimentos de Moradia foram às ruas exigir a abertura de diálogo com os governos, para que possam ser priorizados em suas reivindicações, foram também cobrar uma Política Nacional de Reforma Urbana que garanta função social da terra.
Dia 19 mais um dia de luta na vida desses movimentos, porque o que a vida quer delas/es, de nós: é coragem!

*Por Patrícia Rodrigues, socióloga, trabalha na Fundação Perseu Abramo e é militante do Movimento de Moradia e da Marcha Mundial das Mulheres 

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Especificidades da questão feminina nos perversos efeitos da proibição

Veja também vídeo sobre drogas e mulheres, com Helena Ortiz em http://www.youtube.com/watch?v=SuPdI4zLj84&feature=related
A ideia do debate “Os efeitos da proibição das drogas sobre as mulheres”, realizado dia 10 de maio na PUC-SP, surgiu da constatação da carência de análises acerca do proibicionismo das drogas com um recorte de gênero, além da observação da própria masculinização dos espaços do movimento antiproibicionista, que contam ainda com um número reduzido de mulheres. Assim, o Coletivo DAR e a Marcha da Maconha SP organizaram a atividade em conjunto com o CA Benevides Paixão e os coletivos feministas Yabá e 3 Rosas, convidando para a conversa a Ana Araújo da Marcha Mundial de Mulheres; Natália Corazza, doutoranda em antropologia pela UNICAMP (pesquisa relações afetivas entre presas); Alessandra Teixeira, advogada do IBCCRIM, doutoranda em sociologia e integrante do Grupo de Trabalho Mulheres Encarceradas; e Pedrão Nogueira, do DAR e da Marcha da Maconha SP.

As históricas bandeiras de luta das mulheres, assim como a militância dos que buscam alternativas à atual política de guerras às drogas têm já de cara a convergência de serem lutas políticas contra um status quo sustentado por interesses econômicos e valores morais milenares que ainda balizam nossa estrutura social. Além disso, foram levantados ainda uma série de pontos de confluência entre as duas frentes de luta.

Autonomia sobre o próprio corpo

Os dois movimentos encontram obstáculos nos mecanismos legais de incidência do Estado nas decisões da esfera privada das pessoas. No caso específico das mulheres, uma de suas principais pautas é a defesa da legalização do aborto, cuja proibição acarreta em milhares de mortes maternas em todo o mundo. De acordo com o relatório Morte e negação: abortamento inseguro e pobreza, divulgado em 2007 pela Federação Internacional de Planejamento Familiar (IPPF), a cada ano são realizados 46 milhões de abortos no mundo, dos quais 19 milhões são feitos de forma insegura e 70 mil resultam em morte materna. Dos procedimentos inseguros, 96% são feitos em países “em desenvolvimento”. Na América Latina foram registrados 17% dos abortos clandestinos, ficando atrás somente da África, com 58%. No Brasil, o aborto feito de forma insegura é a quarta causa de morte materna, sendo a primeira em Salvador. Da mesma forma que o Estado legisla sobre o direito da mulher decidir ou não pela interrupção de uma gravidez, ele impõe aos cidadãos quais substâncias psicoativas podem ou não ser consumidas pelo corpo de cada indivíduo.

A jurisdição sobre a vida das pessoas, além de causar inúmeros danos diretos, é justificativa para a criminalização das pessoas, colocando-as à beira dessa ordem social estabelecida”, expõe Ana Araújo. Não por acaso, o setor da sociedade que sofre na pele a criminalização do aborto e das drogas é o mesmo: nem os usuários de drogas que tem dinheiro para comprar as substâncias ilícitas que consomem nem as mulheres ricas que podem fazer o aborto em clínicas clandestinas de qualidade sofrem de repressão pelo aparto policial.

Além disso, tanto a proibição do aborto quanto do consumo de certas drogas têm raízes eminteresses políticos e econômicos que buscam respaldos em dogmas morais e religiosos, representando um ataque à teórica laicidade do Estado. Ana lembrou, ainda, que um dos argumentos usados contra a legalização nos dois casos é que assim aumentaria o número de usuários de drogas ou de prática de abortos. “As políticas atuais contra as duas práticas tem se mostrado absolutamente ineficientes”, observa, ressaltando que o argumento é bastante frágil “em primeiro lugar porque é uma especulação e em segundo lugar porque no caso do aborto isso é tratado como se esse fosse se transformar num método contraceptivo, isso é uma falha grosseira”.

Hierarquização das lutas

A pauta feminista e a pauta pela legalização das drogas são sempre tidas por uma visão equivocada da esquerda no Brasil como pautas secundarizadas”. A constatação foi consenso entre os militantes de cada uma dessas duas frentes que estavam compondo a mesa do debate. “A principal pauta é sempre a luta de classes. Só que aí tem um equívoco claro, essas lutas estão ligadas à luta de classes porque é impossível criar novos homens, novas mulheres e consequentemente uma nova sociedade se você não trava essas lutas no cotidiano”, afirma Ana.
Pedrão chamou atenção ainda para o fato de que o debate antiproibicionista, por ser de certa forma mais novo dentro da esquerda, é ainda mais negligenciado. “Ainda que muitas vezes as questões ligadas às mulheres, aos negros, aos homossexuais não saiam dos papéis das resoluções da esquerda, de certa forma já ganharam alguma aceitação”, reflete Pedrão, acrescentando a dificuldade que os militantes antiproibicionistas têm de quebrar estereótipos que superficializam as discussões políticas intrínsecas ao debate das drogas: “Tem muita gente que fala ‘ah, o que esses maconheiros estão falando agora?’, e ainda setores que chegam a defender a proibição das drogas”.

Assim, foi ressaltada a necessidade das lutas congregarem tanto mudanças macro-econômicas como transformações das concepções e relações sociais cujas raízes são até anteriores ao capitalismo. “Quando uma luta avança, nenhuma outra retrocede”, lembraram.

Criminalização e encarceramento das mulheres

A militarização nas favelas sob a justificativa de guerra às drogas também atinge as mulheres de um modo específico além de representar uma violência geral a toda a população. Além de abusos sexuais e agressões psicológicas, dados do sistema prisional de 2009 indicam que cerca de 50% das mulheres mantidas no sistema carcerário são por comércio e/ou porte de entorpecentes, frente a 20% de homens detidos pelo mesmo motivo. “Efetivamente em números proporcionais a mulher sofre muito mais na pele os efeitos da criminalização das drogas. Mas ela comete mais o tráfico?”, questiona Alessandra Teixeira ao iniciar sua exposição.

A advogada relembra Foucault ao discorrer sobre essa economia criminal, que o filósofo classificava como um tipo de gestão diferenciada de legalismo por parte do Estado. “O que faz o Estado quando criminaliza? Pune uma camada seleta de pessoas e tira um lucro ilícito em cima disso”. Ao fazer um paralelo com o mercado da prostituição – considerada por Alessandra como a primeira grande economia criminal urbana brasileira –, ela ressalta que uma economia ocupa o espaço da outra por volta dos anos 1970.

As mulheres estavam no centro dessas duas economias. No caso da prostituição eu não preciso nem dizer, como a ponta mais fraca e explorada de um mercado que mobilizava muitos recursos, agentes públicos, lucros, enfim, e que tinha participação do Estado diretamente, e no mercado da droga a mulher vem desde os anos 1990 desempenhando também um papel fundamental” analisa Teixeira.

Foi lembrado que na cadeia do tráfico das drogas, as mulheres raramente ocupam um papel administrativo, mas ficam nos pólos mais vulneráveis, muitas vezes se encarregando de tarefas mecânicas como embrulhar, armazenar, etc., em ambientes mais privados ou sendo o que se chama de “mula”, quando se transporta drogas para dentro de presídios ou outros lugares. Não raramente são nesses momentos do processo em que se faz a detenção. “Muitas vezes a precariedade e vulnerabilidade das mulheres nessas condições ainda é maior quando se leva em conta que muitas delas são chefes de família. Essas mulheres encarceradas são em sua maioria chefes de família, mães solteiras”, relata Alessandra, ao apresentar o impressionante dado de que 90% das mulheres encarceradas são mães e quase 80% delas são mães sem os pais dos filhos presentes.

A criminalização com a proibição das drogas gera o quê? Uma economia criminal, um mercado. E esse mercado transaciona um produto que é comercializado – pode ser a droga, a prostituição, etc – mas também transaciona mercadorias políticas ilícitas: extorsão, a caixinha, a corrupção, todas as formas em que o Estado comparece nesse mercado para tirar a sua vantagem”, observa Alessandra, que completa: “Nessa trama, a mulher está sempre a desempenhar um papel de desvantagem, porque se ela desempenha um papel de desvantagem na sociedade, ela vai desempenhar de uma maneira mais intensa ainda na prisão”.

Precariedade do sistema prisional feminino

Natália Corazza, que desenha em sua tese uma análise etnográfica de mulheres presas, chamou a atenção para as múltiplas possibilidades de aprisionamento pelo tráfico e a partir daí os muitos efeitos que podem incidir sobre diferentes perfis de mulheres. Para ilustrar isso, expôs quatro histórias de mulheres fictícias, mas baseadas nos relatos e convivências que a antropóloga vive nas dois presídios nos quais trabalha: a Penitenciária Feminina da Capital, prisão majoritariamente de presas estrangeiras, e a Penitenciária Feminina de Santana (antiga Penitenciária do Estado, presídio masculino), que mantém praticamente só presas brasileiras.

Maria da Paz é uma dessas personagens. Está presa hoje na Penitenciária Feminina de Santana,fumava crack desde os 6 anos, cresceu na “cracolândia” e para se sustentar fazia alguns programas. Quando consolidou uma relação fixa com um homem também habitante da região,deixou de fazer programa e começou a vender dessas pequenas pedras demonizadas. Foi presa. “Numa conversa com uma das pessoas que pode estar bastante inserida nessa cenário, uma delas me disse ‘eu preferia fazer programa, pelo menos eu não era presa’, conta Corazza.

Já Fátima é inglesa, branca, casada, heterossexual e está presa na Penitenciária Feminina da Capital. Ela e o marido circulavam por vários lugares do mundo levando drogas, foram presos diversas vezes, essa era a forma de vida deles. Tatiana era empregada doméstica, morava em uma região periférica de São Paulo, tinha o marido preso e resolveu entrar com drogas na prisão masculina onde o marido dela estava. Para fazer isso teve contato com quem comandava esse tráfico dentro da prisão, que não era o marido dela, mas eram os irmãos do Primeiro Comando da Capital (PCC). Foi presa.

O quarto cenário é de Gabriela, que desde os 6 anos visita familiares na prisão. Ela, como grande parte da família, passou a administrar o negócio a medida que outros foram presos até que em algum momento ela foi detida. “Acho interessante que ela é esposa de um homem do PCC, ela então, ocupa uma situação de só estar administrando o negócio porque os homens não estão. E quando ela vai pra prisão ela atende a diversas regulamentações que vem da prisão masculina”, observa Natália. “O PCC, bastante financiado pelo tráfico de drogas, muda a chave do convívio das prisões femininas num âmbito de que quem passa a ordenar o que é certo ou errado nas prisões femininas é um coletivo de presos masculinos”.

O presídio feminino é todo pautado a partir de regras, de lógicas do encarceramento masculino. Isso não é só o fato de que as prisões são concebidas para homens e as mulheres que vivem lá, pois isso é recorrente, mas é mais que isso: o código disciplinador da prisão, não o formal mas o informal, é um código masculino”, acrescenta Alessandra Teixeira.

Foram ressaltadas ainda, as precárias condições a que as mulheres são submetidas dentro dos presídios. A falta de absorventes na maior parte das penitenciárias, os numerosos abusos sexuais e psicológicos, a falta de atendimento médico entre os quais o ginecológico, o descaso dado aos cuidados necessários para as grávidas, entre outros. No que diz respeito às visitas íntimas, em alguns presídios – principalmente os em que o PCC se faz mais fraco e o Estado mais presente – existe um controle moralista dos visitantes de modo que as mulheres têm de provar que tem com aquele homem um laço conjugal. Permissão para visitas íntimas homoafetivas não existe.
Outra questão levantada como um fenômeno relativamente novo é o aumento da medicalizaçãodas mulheres envolvidas com drogas e o consequente povoamento feminino nos manicômios judiciários. “Elas estão presas por tráfico, mas muitas vezes numa condição de usuárias também. Hoje acho que o proibicionismo da droga está desempenhando esse papel também, essa lógica da medicalização”, reflete Alessandra. O paralelo com o fato das mulheres historicamente serem a clientela preferencial dos manicômios, por serem agentes do que era categorizado como desordem social ou histeria (na verdade uma simples negação do papel social imposto às mulheres), não é mera coincidência.

Machismo nos movimentos sociais
Ainda que não seja novidade a presença do machismo em todos os setores da sociedade, incluindo os espaços da esquerda que se posicionam contra qualquer tipo de opressão, a exposição de Pedrão Nogueira chamou a atenção para a carência de militância feminina (e feminista) nos espaços antiproibicionistas. Levantou algumas hipóteses para explicar o porquê.

A cultura das drogas hoje em dia eleva o machismo em potências que não se observa em outros campos culturais, em grande parte pela própria ilegalidade. Pensei em um exemplo que está bastante enraizado na cultura de uso da cannabis, mas também de outras drogas: quase sempre é homem que chega e apresenta a droga”, reflete. “Por carregar o estatuto de ilegalidade, normalmente é o homem que vai na boca, o namorado que apresenta o baseado, ou o amigo, de modo que as mulheres perdem até a autonomia para decidir sobre o próprio uso”.

Exemplificou, ao falar de formas mais explícitas em que o machismo aparece no movimento antiproibicionista, com os concursos de Miss promovidos por alguns sites ou mesmo ensaios fotográficos que mostram mulheres seminuas com folhas de maconha. “Outro motivo para suspeitar que mulheres que possivelmente se aproximariam do movimento tenham vontade de se afastar, o fato de se sentirem objeto ao invés de sujeito daquela luta”.

Assim, o debate se encerrou com um chamado a todos – mas principalmente a todas – para participarem da Marcha da Maconha em suas cidades e se fazerem presentes nos espaços do movimento antiproibicionista. É bom que as mulheres vejam que a sua ausência está sendo notada” afirmou Pedrão.

domingo, 15 de maio de 2011

A cerveja Devassa e a questão da mercantilização do corpo feminino

Não é de hoje que a cerveja Devassa, sua publicidade e comercialização, estão em pauta pela questão do machismo e inclusive racismo vinculado ao produto. Respondendo no Conar – Conselho de autorregulamentação publicitária - três processos jurídicos por ter conseguido o que se era inimaginável: extrapolar o “comum” uso da imagem feminina vinculado à venda de cerveja, uma vez que todas as propagandas e marcas sempre expuseram a mulher de forma depreciativa e, mesmo com criticas feministas, dos movimentos sociais, e militantes da esquerda em geral, nunca mudaram em nada a sua estratégia de venda, ou sofreram processos por isso validados pelos juízes.


Todas as marcas sempre venderam em seu marketing não a cerveja, mas as mulheres. O incentivo para o consumo sempre esteve relacionado à dominação do sexo oposto (não podendo nem falar em “conquista”), e essa se daria pela “incrível” atração que as mulheres sentiriam pelos homens que bebem o produto, ou, na maior parte dos casos, sendo as mulheres entendidas como próprio produto. A cerveja Antártica, por exemplo, transforma as mulheres em mercadoria ao usar como slogan “A cerveja BOA” e a Juliana Paes, ou o apelido conferido de “loura” para a mercadoria, e todos os comerciais com mulheres erotizadas, seminuas, “servindo” aos clientes no bar.

A Devassa consegue dar um “passo além” nessa discriminação e mercantilização. A começar pelo seu nome: “Devassa”, usado no feminino. A mesma versão, no masculino, possui outra carga de valor; a começar que é um adjetivo, “devasso” e “devassa” um substantivo feminino, havendo uma mudança na carga semântica:
Devasso-de.vas.so(adj.) 2 Libertino, licencioso.
Devassa-de.vas.sa (sf) 1 Ato ou efeito de devassar.
devassar-de.vas.sar (vtd) 1 Invadir ou observar (aquilo que é defeso ou vedado), 3 Descobrir, penetrar, esclarecer 4 Olhar, contemplar 6 Prostituir(-se), tornar(-se) devasso [1]
Logo percebe-se, sem grandes esforços, a o método utilizado para veiculação do produto: você compra uma mulher, prostituída indiscaradamente. Outro passo, ainda na obviedade, que qualquer pessoa pode ver, mesmo sem assistir ao comercial ou ver a propaganda nos cartazes, simplesmente olhando o produto: na lata uma mulher em pose erótica, seminua. Esse é o logo, a referência. E seu slogan: “Um tesão de cerveja”.

Superficialmente, nos aspectos mais básicos do produto – embalagem e logo-, a cerveja já se mostra completamente machista, e capaz de intensificar a mercantilização do corpo feminino, que já é uma “regra” do marketing das cervejas, de uma forma indiscutível. Somente por esses aspectos já se explica o veto à marca que aconteceu e acontece por parte das feministas e militantes em geral.

A situação, contudo, consegue piorar ao assistirmos o anúncio com a Paris Hilton, veiculado em uma das maiores emissoras de televisão, a rede Globo, com a chamada “Bem loura, bem devassa”. Sofrendo um processo legal e tendo de “mudar” seu comercial, satiriza a crítica, colocando ‘tarjas’ na mulher e recomendando que seja vista a versão original na internet, e na abertura do vídeo escrevem: "O filme da cerveja Devassa com Paris Hilton foi retirado do ar. A quem se sentiu ofendido, oferecemos um filme novo.”. Como se não houvesse ofensa, como se as pessoas tivessem se sentido ofendidas sem um motivo real. Nessa, entraram os defensores da “liberdade de expressão”, como se fosse um AI-5 se indignar com a venda de pornografia no lugar da cerveja, invertendo os papéis.

Depois, lançam a campanha para divulgar a cerveja escura (Dark Ale), com uma mensagem racista e machista: “É pelo corpo que se reconhece a verdadeira negra”, e a imagem de uma mulher negra, sensual, magra e em pose erótica, usando da idéia de que só há corpo, não mente e opinião, nada.

Ganhando visibilidade com essas “polêmicas”, ou, em outras palavras, com a opressão da mulher, a marca, mesmo respondendo a processos, vem ganhando mercado e público. Vários bares já adotaram em seus letreiros o nome “Devassa” e mesas e cadeiras vermelhas de plástico com o logo da cerveja proliferam em todos os lugares.. Foi aí que a questão começou a ficar mais problemática, em especial se você tem veto contra a cerveja. Além de sair e não ter o que beber (porque sim, em muitos lugares só existe essa bebida sendo comercializada), sempre começa a discussão: “mas todas as outras cervejas também são machistas, dá no mesmo”. Sim, todas são. Todas vendem o corpo feminino como produto, mas a Devassa extrapola esses “limites”, o “velado”, que já é horrível por si só e que ajuda na objetificação da mulher. Mas a aceitação, por parte da sociedade brasileira, do machismo descarado da Devassa é, sim, um problema, e deve ser encarado de maneira mais séria por parte dos ativistas (muitos dos quais não se preocupam em denunciar nenhum tipo de machismo, nem o velado, nem o descarado).

Sempre que esse debate entre em voga várias pessoas argumentam dizendo que todas as cervejas era tão machistas quanto a Devassa, e que dava no mesmo eu comprar aquela lata com uma mulher nua, ou comprar uma de qualquer outra marca, então, decidi fazer uma pesquisa das principais marcas e propagandas, entrando nos sites, vendo os vídeos. Todos os sites de bebidas alcoólicas perguntam se você é maior de idade, e se é responsável pelo acesso, menos o da Devassa. Nesse não tive que declarar nada. Em todos os sites você pode ver as propagandas e os produtos, de maneira geral, nada que varie muito. No da Antártica, você pode ter uma “ajuda” sobre como preparar festas, há um sistema de cálculo pessoas-comida/bebidas, nada demais. Somente o da Devassa conseguiu ser mais machista ainda.

O site possuí muitos outros “atrativos”, como a história da cerveja, um “manifesto”, “gifs”, e um “canal devassa” com informes do produto. Fui visitando link por link. Nenhum outro site vendia a mulher da mesma forma, ou vinculava diretamente, conscientemente o produto à imagem da mulher:

“Uma cerveja que se autoproclama Devassa deve ser no mínimo autêntica. Porque assume tudo o que as outras cervejas gostariam de ser, mas morrem de vergonha.
Devassa é bem alegre, tem aquele astral que atrai coisas boas, pessoas interessantes e papos divertidos. Pedir uma Devassa tem a dose certa de segundas intenções.
Quem bebe Devassa procura liberdade. Nada de fazer tipo, caras e bocas, fingir ser o que não é.
Devassa é bem espirituosa, te pega pelo colarinho, te seduz pelo aroma e faz você se apaixonar de vez pelo sabor.
Tanto que muita gente não resiste à tentação. E assim como a cerveja, Devassa tem seu irresistível chope - cru, não-pasteurizado e sempre fresquíssimo. Além da suavidade e do sabor inconfundível, tem um creme que é pura luxúria. Bastam dois a três dedos para garantir uma legião de fãs. Enfim, quem conhece sabe.
Com Devassa a vida fica bem gostosa.” (grifos meus)

Ao lado do manifesto você pode se informar mais sobre a Devassa, clicando em outros links (que, confesso, não cliquei. Já estava saturada de machismo): “A história da Devassa é um tesão” e “Daqui sai um tesão de cerveja”.

Na seção dos produtos, um diferencial que não vi em mais nenhum site de nenhuma marca de cerveja: as variedades são denominadas por: “loura”, “ruiva”, “negra”, “índia” e “sarará”. Você compra, diretamente, a sua preferência feminina, não a cerveja, e as descrições do produto giram em torno de atributos femininos, de sua descrição corporal. Em um cardápio de bar você não compra a cerveja, mas a mulher, diretamente. Em outras marcas, a propaganda remete à venda do corpo, , mas não é, de fato, a venda. Comprando a Devassa, você paga o preço de uma loura, ou ruiva, ou negra, ou índia, ou sarará.

As mulheres estiveram, em muitas épocas da humanidade, e ainda estão, ligadas à troca de produtos, ou sua venda, tendo sua existência balizada por valores atribuídos às mercadorias. Seja como escravas, - como, por exemplo, acontecia em sociedades da Antiguidade Clássica- onde eram tidas como espólio de batalhas, ou no séc. XX, com a questão dos “dotes”, em que seu valor era medido por suas habilidades como dona-de-casa e esposa, e, também, no quanto “valeria” para o homem e se seria lucrativo, assim, o enlace matrimonial. Superada a caracterização como tesouro de guerra, e a questão do dote como situação cultural e “natural”, ainda não se desvinculou a mercantilização do seu corpo e, conseqüentemente, de sua existência enquanto indivíduo.

A caracterização da feminilidade passa por uma série de preceitos ditados pela publicidade e propaganda, tanto na questão de produtos que tenham por público alvo as mulheres, quanto em anúncios destinados aos homens, que têm o consumo incentivado pelo pelo suposto “prazer” que as mulheres sentiriam em ver homens usando determinado produto e a conseqüente “conquista” das fêmeas por isso - que seria a função principal. O que leva a uma caracterização estética, comportamental e, também, do próprio prazer feminino e, nos dois casos, a mulher é colocada como mais um produto de consumo masculino.

Subjugadas à situação do mercado e às expectativas masculinas, as mulheres se vêem obrigadas a adotar uma série de comportamentos e padrões. Tal qual a questão da “magreza”, posta como uma questão de “saúde” e cuidados com o corpo, sendo que o que se vê na atualidade é o crescente números de jovens que sofrem de transtornos alimentares, como anorexia e bulimina. De acordo com estatísticas, essas duas doenças atingem cerca de 20% dos jovens – entre 15 e 20 anos - e afetam 10 mulheres a cada 1 homem[2] . Além da questão do “manequim” feminino, se observa, também, uma crescente insatisfação com o próprio corpo no que tange às “formas”, com um crescimento de 300% nos últimos dez anos de aplicações de próteses de silicone, e as 70 mil cirurgias plásticas realizadas em 2006, atingindo um marco nunca visto na sociedade brasileira.[3]

“(...) o peso das modelos de moda desceu para 23% abaixo do peso das mulheres normais, aumentaram exponencialmente os distúrbios ligados à nutrição e foi promovida uma neurose de massa que recorreu aos alimentos para privar as mulheres da sua sensação de controle. As mulheres insistiram em dar um caráter político à saúde. Novas tecnologias de cirurgias "estéticas" potencialmente fatais foram desenvolvidas com o objetivo de voltar a exercer sobre as mulheres antigas formas de controle médico.” 4

As propagandas de cerveja corroboram para esses padrões. São mais um dos diversos mecanismos empregados para propagar um ideal de beleza e existência que não existe.

Felizmente, atualmente, muitas marcar de cerveja já mudaram e melhoraram em muito, sua maneira de comercializar o produto - ainda que outros avanços ainda sejam necessários, como desvincular a imagem de cerveja como um produto masculino, por exemplo. Os novos comerciais deste ano ganharam outro caráter; no mais das vezes mostram amigos, samba, e personalidades famosas.

Menos o da Devassa, que se mantém na linha do machismo e mercantilização escancarada do corpo da mulher. Nesse primeiro semestre, mudaram sua “garota propaganda” para a Sandy, ícone de uma geração toda como “santa”, “casta”, “modelo a ser copiado”, querendo deixar claro que qualquer mulher é devassa, podendo ser um produto fácil de ser adquirido, já que até a mulher mais pura pode fazer um comercial erótico e ser musa da marca.

Obviamente não foram as marcas de cerveja, nem a Devassa por si, que criaram nem a mercantilização do corpo feminino, nem a dicotomia entre mulheres “santas” e “putas”, nem a caracterização da cerveja como algo masculino, nem o racismo. Mas, reforça e dissemina essas idéias utilizando-se de uma falsa idéia de “libertação sexual”, coloca a idéia da mulher-objeto como “natural”, “bem aceito”, ligado ao seu “público alvo”, o famoso backlash .


Por isso, como já disse uma colega de militância: não tomo Devassa e chamo de machista quem vende!


Texto original em: http://nascermulher.blogspot.com/

[1] Significados retirados de Dicionário Michaelis Online http://michaelis.uol.com.br, e colocados os significados referentes ao contexto, para visualizar todos os outros:http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=devassar
[2]
 Dados retirados de Jornal da Manhã – MG Por Fahim Sawan - Médico e Deputado Estadual
[3] Texto original em “Cadernos Marcha Mundial de Mulheres” Disponível em:http://www.sof.org.br/arquivos/pdf/Miolo_MMM.pdf
[4] WOLF, Naomi O mito da Beleza- como as imagens de beleza são usadas contra as mulheres, Ed. Rocco, 1992, p. 14

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Qual a graça?

Umas das principais polêmicas da semana é a entrevista da revista "Rolling Stone Brasil" com o cqc Rafael Bastos. A matéria revela um trecho do show do comediante, em que ele diz, referindo-se ao estupro de uma "mulher feia": "Tá reclamando do quê? Deveria dar graças a Deus. Isso pra você não foi um crime, e sim uma oportunidade." 

Ora, na mesma semana em que jovens de três estados foram detidos por atuarem num movimento que defende a legalização da maconha, acusados de "apologia às drogas", as declarações de Bastos suscitam alguns questionamentos. Por um lado, os jovens mencionados estavam exercendo seu direito à livre manifestação de ideias, defendendo seu ponto de vista, disputando sua opinião na sociedade legitimamente. 

De outro lado, Rafael Bastos, cujo discurso não tem nenhuma dessas características, não poderia ser acusado de apologia a um crime hediondo? Por que? Porque aquilo pretende ser uma piada? Porque ele só quer "desconstruir o politicamente correto"? Porque é famoso e ganhou carta branca pra dizer as barbaridades que quiser impunemente?

Há meios inteligentes, ou pelo menos, não tão vulgares, de pôr o "politicamente correto" em questão. Sugerir o estupro de mulheres e promover sua banalização não choca o moralismo, choca quem, há décadas, concentra esforços para denunciar e combater essa violência injustificável - que não é ficção, é de verdade, mais comum e mais impune do que se imagina.

Tratar estupro como piada passa por cima de tantas mulheres que o machismo já vitimizou por meio dessa arma cruel, legitima essa violência, conferindo-lhe o status de coisa qualquer, coisa da vida, coisa que acontece e pode ser tolerada. Esse é o texto implícito. Não precisa se dedicar muito pra entender.

Acontece que estupro não é piada, não é engraçado, não é tolerável e não há atenuantes. Banalizar esse assunto é tornar-se cúmplice dele. Não há meio termo. Aceitar rir de si mesmo é uma coisa. Rir de uma mulher estuprada é outra completamente diferente.

A quem quer caçoar do "politicamente correto", que o faça sem brincar com o que não tem graça nenhuma. Indicar o estupro como "oportunidade" num texto humorístico não é bonitinho, nem engraçadinho, nem original, muito menos inteligente. É cruel, leviano, beira o fascismo. Atitudes como essa, travestida de moderninha e descolada, é o que de mais reacionário pode haver numa sociedade desigual como a nossa. Afinal, por que Bolsonaro é criticado quando fala sério, mas Rafael Bastos tem autorização pra falar "brincando"?

Violência contra a mulher é crime. Não tem graça. Não tem desculpa.


Por Alessandra Terribili, jornalista e militante da Marcha Mundial das Mulheres
Fonte: http://terribili.blogspot.com/2011/05/qual-graca.html